Jornal da Praceta

 

Manifesto

Lisboa Precisa desta CML ?

(2009)

Para que serve a actual Câmara Municipal de Lisboa (CML) ? A esmagadora maioria dos lisboetas tem dúvidas sobre a sua utilidade. Ninguém consegue perceber a utilidade da maioria dos autarcas, dirigentes e assessores, mas também de dezenas de departamentos, serviços, divisões, das dezenas de empresas municipais e 53 freguesias espalhadas pela cidade.

É difícil justificar a existência de estruturas autárquicas tão dispendiosas, quando os serviços prestados à população são tão medíocres. 

A única solução para este caos é a criação de um movimento cívico para acabar com a actual CML, alterando profundamente as suas estruturas, modo de funcionamento e participação dos munícipes. É urgente uma limpeza geral  expulsando à força os múltiplos bandos de parasitas e mafiosos que nela se instalaram. 

1. A Morte de Lisboa

O crescente despovoamento da cidade é o melhor exemplo das políticas criminosas que tem sido prosseguidas nas últimas décadas. A população de Lisboa desde o princípio dos anos 80 que não pára de diminuir, ao ritmo de 11 mil pessoas por ano. Em 1981 a cidade contava 807.937 habitantes. Em 2007 tinha 499.690, e um ano depois eram apenas 489.562 (dados do INE). Desde 1981a população já diminuiu mais de 40% . Dos 300.000 fogos existentes, cerca de 60.000 estão abandonados. 

A população de Lisboa tem sido brutalmente atirada para a periferia da cidade, onde reside em verdadeiros guetos. Um movimento migratório que tem provocado uma enorme devastação da paisagem e recursos naturais. 

Os que teimam em ficar na cidade vivem cada vez mais em ruas ou bairros desertos, onde a criminalidade violenta e organizada tem agora excelentes condições para se instalar e actuar.

A degradação urbana tornou-se a imagem de marca de Lisboa. Não são apenas milhares os edifícios abandonados, mas também inúmeros fachadas alteradas impunemente por marquises e construções clandestinas. A fiscalização camarária é inexistente. O ambiente urbano, em muitas zonas, é deprimente. 

A maioria da população residente é cada vez mais constituída por idosos, reformados ou pessoas que vivem de subsídios do Estado, o que se traduz na perda de dinamismo económico e capacidade de inovação da cidade.  

A maneira encontrada pela CML para manter ainda residentes em muitas áreas da cidade tem sido a de construir bairros sociais, onde vive presentemente um terço da população. Esta população tornou-se na principal base eleitoral dos principais partidos políticos, por esta razão tornaram-se complacentes com todo o tipo de impunidades e ilicitudes que neles ocorrem. É aqui que vão buscar votos para perpetuarem a ladroagem na autarquia.  

Fruto desta gestão urbana surreal, a criminalidade não tem parado de aumentar numa cidade despovoada: Em 2001 ocorreram em Lisboa 98.822 crimes, sete anos depois registaram-se 110.211. A criminalidade violenta e organizada ano após ano bate todos os recordes.  

2. Uma Contradição Insanável

O número de habitantes de Lisboa não tem parado de diminuir, mas os serviços camarários não tem parado de engordar, aumentando o número de dirigentes, funcionários, assessores, contratados, etc.

A ladroagem instalada na CML e seus apêndices, não se limitou a sugar as receitas camarárias,  que não pararam de aumentar  devido a fundos comunitários, aumento de impostos, transferências do estado central, etc. Insaciável, a ladroagem camarária, desde finais dos anos 90 tem vindo a acumular dividas atrás de dividas, hipotecando o futuro de Lisboa. 

As dividas acumuladas em 2006 já ascendiam a mais de um bilião de euros (mil milhões de euros) ! Em 2009, apesar de todos "cortes", são superiores a mil milhões e trezentos milhões de euros. Este é o panorama da gestão autárquica da capital de Portugal.

Embora tivesse sempre cada vez mais dinheiro, a verdade é que a CML, com excepção dos túneis, viadutos e bairros sociais, não parou de diminuir os investimentos , assim como os serviços que passou a prestar à população. Inúmeros equipamento urbanos, como escolas, creches, mercados, piscinas, bibliotecas, jardins foram encerrados ou abandonados.    

Para onde tem ido o dinheiro ? A resposta é simples: - Foi aplicada na própria CML, para manter a enorme massa de autarcas, dirigentes e funcionários cada vez mais caros e incompetentes. 

3. Impunidade

A  cultura perdulária há muito instalada na CML atingiu nos últimos anos uma dimensão insuportável, o despudor é total. Apesar da situação económica do país, marcada por fortes restrições orçamentais, as dívidas da CML disparam nos últimos anos para valores astronómicos.

Orçamento camarário é esbanjado na contracção de inúmeros assessores e funcionários, manutenção de empresas municipais inúteis, pagamento de horas extraordinárias sem nenhuma justificação,  avenças, manutenção de uma impressionante frota de viaturas, despesas sumptuários, como a aquisição de viaturas de luxo, festas e iniciativas de utilidade duvidosa. 

Milhares de funcionários municipais, embora tenham contratos a tempo completo, trabalham para outras empresas particulares, muitas das quais têm a própria Câmara como o seu principal cliente. Como se tudo isto não bastasse, a CML gasta fortunas todos anos a contratar serviços externos para substituir os seus próprios funcionários !  

O descalabro chegou a tal ponto que, em 2006, os elevados recursos financeiros CML deixaram de ser suficientes para assegurar as despesas correntes da autarquia, nomeadamente o pagamento da gasolina para as viaturas que estão ao serviço de uma multidão autarcas, dirigentes, funcionários, contratados e avençados da CML (entre 10 a 14 mil pessoas). 

Face a este descalabro, tornou-se impossível ocultar a bandalheira que reina na Câmara Municipal de Lisboa. O que ainda havia para roubar deixou de ser suficiente para manter a parasitagem, o que provocou fortes conflitos internos entre os vários bandos de mafiosos que passaram a degladiarem-se entre si. 

A autarquia desde então tem sido sacudida por uma sucessão impressionante de casos de corrupção e tráfico de influências. Em causam estão não apenas os serviços camarários, como os do urbanismo ou os serviços jurídicos, mas sobretudo as empresas municipais que revelaram-se um antro de gatunagem. 

O património municipal, nomeadamente milhares de habitações camarárias, está literalmente a saque. Um número indeterminado de habitações camarárias, em princípio destinadas aos habitantes mais necessitados, são atribuídas pelos autarcas a si próprios, aos seus familiares, amigos, jornalistas e uma vasta rede clientelar

É hoje consensual que a maioria das empresas municipais foram criadas desviar dinheiro para os partidos políticos, duplicar ordenados dos autarcas, mas também para dar emprego aos múltiplos bandos de parasitas gravitam em torno dos partidos políticos, presidentes e vereadores. 

Em fins de Janeiro de 2007 as suspeitas de corrupção atingiram o próprio executivo camarário, provocando eleições antecipadas. Uma vereadora suspende o mandato, a imprensa apontou as baterias ao vice-presidente da autarquia que não tardou também a seguir o mesmo caminho. O descrédito da CML é total. Em quase nove  séculos de existência não há notícias de uma situação idêntica.  

António Costa foi eleito presidente da CML, a 15 de Julho de 2007, por menos de 10% dos eleitores inscritos! Ninguém acreditava que fizesse alguma coisa para mudar a situação e de facto pouco ou nada fez.  O monstro continua a corroer Lisboa. 

4. Ninguém Presta Contas.

 A CML é um organismo impenetrável. As responsabilidades estão diluídas. Os últimos presidentes da CML remeteram-se ao mais completo silêncio quando os munícipes lhes solicitam esclarecimentos. 

As poucas informações que a CML presta são tardias e frequentemente contraditórias. A multiplicidade de orgãos, procedimentos, regulamentos resiste a qualquer tentativa, de escrutínio dos munícipes. Ninguém sabe para que servem a maioria dos departamentos, serviços, divisões e empresas municipais, mas suspeita-se que só sirvam para alimentar bandos de inúteis. 

O património confiado à CML estão a degradar-se, mas ninguém sabe quem são os responsáveis por esta situação. Em alguns casos, o saque só foi objectivamente possível porque houve necessariamente cumplicidade de serviços camarários com os ladrões. Um exemplo: 

- A Igreja de São Lourenço, fundada em 1258 ou 1271, e integrada no Palácio da Rosa, em plena zona histórica foi nos últimos anos completamente saqueada. Os ladrões ao longo de muitos meses ou anos roubaram os seus preciosos painéis de azulejos do século XVII, o altar mor de 1630, a sua rica talha dourada, capiteis, estatuária, etc. O edifício foi adquirido pela CML em 1970 e estava desde então á sua guarda. Perante este saque de proporções incalculáveis, um dos responsáveis pelo Departamento Cultural (?) da autarquia, em Agosto de 2009, afirmou a um canal noticioso (SIC Notícias), que a Câmara se limitou a assistir ao roubo, e só tomou algumas medidas quando já nada mais de valor havia para roubar. O roubo é público, mas ninguém na Câmara ou na Assembleia Municipal se preocupou em apurar responsabilidades.  

A gestão urbanística da cidade é errática e ao sabor dos interesses imobiliários, mas a quem pedir contas ?  

 

5. Orgias Turísticas 

Embora esteja cada vez mais deserta, a cidade de Lisboa tornou-se num dos mais importantes destinos turísticos europeus pelos piores motivos. 

Por um lado, o turista desfruta uma dimensão única de surreal decadência de uma capital europeia, repleta de bairros e ruas desertas com milhares de edificios abandonados ou em ruína. Pode assistir ao vivo ao tráfico de droga em pelo centro da cidade, ou ao roubo do seu património, como os magníficos azulejos das fachadas dos seus edifícios, mas também ao mais completo desprezo pelos espaços públicos, o que deixa reconfortados por não terem nascido ou viverem em Lisboa. 

Por outro, no meio desta incomparável sensação de abandono e laxismo, podem apreciar aquilo que a CML melhor tem sabido fazer: as "festanças" para turista ver. Uma multidão de amigos e amantes de presidentes e vereadores, funcionários camarários e empresas pagas pela autarquia está envolvida em organizar ao longo de ano "acontecimentos", "eventos", "festivais", "paradas", "ciclos", "recepções", etc, para mostrar que Lisboa é ainda uma cidade cosmopolita. 

A CML alega frequentemente que não tem dinheiro para arranjar escolas, creches ou fazer obras em edifícios que lhe está confiados, mas na mesma altura atribui enormes subsídios a amigos do presidente ou vereadores ou organiza mais uma festa para clientela do costume cujos custos são várias vezes superiores. Estas são as verdadeiras prioridades camarárias.   

6. A Grande Choldra

Os munícipes habituarem-se a não esperar nada desta CML, muito menos dos candidatos que são escolhidos pelos directórios partidários, para os quais a cidade funciona como uma coutada. Ninguém os leva a sério, nem aos que os substituem uma vez eleitos.

Perante esta quadro, não é de estranhar que o número de cidadãos que vota nas eleições autárquicas há muito que não pára de diminuir. A abstenção ronda os 50% (62,6%-2007; 47,3%-2005; 45% -2001;51,7%-1997).

As políticas municipais preconizadas pelos principais partidos políticos resumem-se em transformar a cidade num vasto corredor para todos os dias acondicionar centenas de milhares de automóveis vindos da periferia. A prioridade dos presidentes da CML tem sido a de abrir túneis, viadutos e construir parques de estacionamento. 

Ninguém parece preocupado com o facto da população que ainda reside na cidade ter sido expulsa dos passeios invadidos pelos automóveis, ou que a poluição estar a colocar em risco a saúde pública: o ar tornou-se, em muitas zonas, irrespirável; o ruido, ultrapassa todos os limites. 

Ninguém parece preocupado com a degradação dos espaços públicos (ruas, praças, jardins, parques, ambiente urbano, etc), nem da miserável qualidade dos equipamentos públicos existentes (escolas, creches, piscinas, rede de transportes, etc).  

Vivendo à custa do erário público, uma larga percentagem de autarcas e dirigentes camarários nem sequer residem na cidade, e quando isso acontece vivem barricados em condomínios fechados, e ao fim de semana fogem para as mansões longe de Lisboa. A cidade como espaço de vivência colectiva nada lhes diz fora da retórica política.

A Assembleia Municipal de Lisboa, onde estes problemas se deviam debater, está alienada das suas funções. Tornou-se num espaço de guerras partidárias, desligadas dos problemas da cidade. Os múnicipes que nela intervêm são frequentemente objecto de chacota por parte de bandos de deputados que nela têm assento.  A sua acção tem sido a de bloqueio sistemático.

Um dos muitos cartazes afixado pela cidade de Lisboa. A guerrilha entre os vários partidos políticos com assento na Assembleia Municipal de Lisboa ultrapassou todos os limites de decência.  A CML ligada ao PS aprovava uma obra, mas a Assembleia Municipal dominada pelo PSD/CDS-PP procurava por todos os meios impedir a sua realização.  As estratégias partidários foram colocadas acima dos interesses da própria cidade. Uma vergonha.   

Será que precisamos desta CML? De tantos e tão maus deputados na Assembleia Municipal ? Não será tempo reclamar a sua extinção ?

 

7. A Completa Inutilidade

A maioria das 53 juntas de Freguesia de Lisboa, estão de tal modo desligadas dos munícipes que se desaparecessem  ninguém daria pela sua falta. As assembleias das juntas tornaram-se meros actos de rotina burocrática, com uma participação esporádica de moradores (fregueses). O desinteresse é total, porque ninguém lhes reconhece qualquer utilidade. As principais funções das juntas são verdadeiros anacronismos administrativos, que há muito tempo já deveriam ter sido suprimidas. 

Quadro das principais funções das Juntas de Freguesia:

- Registo e licenças de cães e gatos.  

- Atestados de residência.  

- Recenseamento eleitoral e militar.

- Autenticação de fotocópias.

É difícil de entender que estas funções e outras similares possam  justificar a manutenção de tantos autarcas, funcionários e o custo de inúmeras instalações. 

Não é apenas a Câmara Municipal e a Assembleia Municipal que se tornaram em viveiros de parasitas, mas também as juntas de freguesia. O número dos seus funcionários e as suas despesas de funcionamento tem aumentado na proporção inversa ao número de habitantes de cada bairro. O descalabro é total.

Existe uma enorme desproporção entre o seu custo e os benefícios residuais que os munícipes obtém. A quase totalidade das funções das juntas poderia ser suprimida ou transferida para outras entidades públicas ou privadas com enormes benefícios para os cidadãos. 

8. A Extinção Necessária.

A mais perigosa ilusão face a este estado de coisas, é pensar que os actuais autarcas podem ser os agentes de uma efectiva mudança. A maioria está de tal forma instalada (acomodada) no sistema que a única coisa que deseja é que tudo fique na mesma, o máximo tempo possível, ainda que isso custe ao contribuintes um elevado preço em impostos, tempo, qualidade de vida, etc. 

É um completo disparate pensar que a existência da actual CML e dos seus apêndices (Juntas, Assembleia, etc), se justifica por questões democráticas. Não só a representatividade dos orgãos autárquicos tem vindo a diminuir, mas também a Democracia não justifica o roubo dos cidadãos para manter estruturas parasitárias.

É por isso, advogamos a criação de um movimento cívico para acabar com a actual CML e as suas ramificações. Refundar a CML é a única alternativa que resta perante o descalabro a que se chegou. 

9. Lisboa Viva

Lisboa não pode continuar a ser a cidade que expulsa e que envergonha os lisboetas. Não pode continuar a ser uma cidade que despreza a sua história, o conhecimento e a inovação. Não pode continuar refém dos especuladores imobiliários e do automóvel, destruindo o que resta dos espaços públicos, praças, passeios e espaços verdes, tornado a vida dos lisboetas num inferno. 

O voto em branco ou nulo - o voto de protesto - é a única posição aceitável face à dimensão caótica que as coisas assumiram na cidade de Lisboa. 

É preciso dizer BASTA !  

Agosto de 2009

Carlos Fontes - Jornal da Praceta

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